domingo, 14 de março de 2010

Nota 7 para Educação de Santo André

Nota 7 para Educação de Santo André


Evandro Enoshita
Do Diário do Grande ABC
Para a pedagoga pós-graduada pela PUC-SP (Pontíficia Universidade Católica de São Paulo) Cleide Bochixio, o sistema educacional de Santo André não é novidade. Tendo atuado na cidade como professora, diretora, supervisora e dirigente regional de ensino, além de ter prestado assessoria educacional em São Paulo e outros Estados, ela coloca à prova a sua experiência sobre o setor. Desde o início da gestão do prefeito Aidan Ravin (PTB), no ano passado, ela está a frente da Secretaria de Educação da cidade.
Em entrevista ao Diário, além de falar sobre a sua experiência, a secretária culpou as administrações anteriores e a burocracia do setor público como as fontes das dificuldades enfrentadas por ela no comando da pasta.
Segundo Cleide, a Prefeitura teve de iniciar do zero projeto curricular para as escolas da rede municipal, que incluiu a reinserção do uso de livros didáticos, que haviam sido abandonados nas gestões anteriores, além da criação de material didático.
A redução do déficit de vagas para a Educação Infantil também foi citada pela secretária, que destacou os projetos de construção de creches e de otimização de espaços em instituições de ensino já existentes, para que elas pudessem abrigar os ensinos Infantil e o Fundamental.
Em relação ao corpo docente, Cleide destacou a necessidade de mais professores para as escolas da cidade, mas minimizou o problema, ao afirmar que a prática de delegar mais de uma sala ao professor "é utilizada em escolas particulares".
Questões como o atraso na entrega dos kits de uniformes escolares e a polêmica causada pela abertura de um concurso para a contratação de professores temporários também foram abordadas na conversa com a secretária.

DIÁRIO - Tendo atuado como professora e dirigente escolar na rede estadual, a senhora sentiu muitas diferenças entre a realidade do estado e a do município?
CLEIDE BOCHIXIO - Atuei pelo Estado aqui em Santo André. Então, embora eu fosse subordinada à Secretaria de Estado da Educação, a minha área de atuação era aqui. A realidade da cidade não me é estranha.

DIÁRIO - Como dirigente de ensino, na década de 1990, a senhora participou do início do processo de municipalização da educação em Santo André?
CLEIDE - Foi em 1995, na primeira gestão do então governador Mario Covas. Foi um processo de reorganização e, depois, municipalização. Então fiz toda a negociação com a Secretaria de Educação do Município, com a gestão do então prefeito Celso Daniel.

DIÁRIO - E como transcorreu esse processo?
CLEIDE - A cidade decidiu que não iria fazer uma parceria com o Estado. Aí começaram a ampliar as escolas do município para atender o Ensino Fundamental e deixaram a Educação Infantil em segundo plano. A cidade começou a concorrer com o Estado. Qual seria a vantagem da parceria? Você absorveria o patrimônio do Estado. Aí que ficou a diferença. Agora precisamos recuperar esses espaços para melhorar o atendimento.

DIARIO - Quais foram os principais problemas que a senhora encontrou ao assumir a secretaria?
CLEIDE - Foi a falta de um projeto curricular definido. Desde o início da municipalização (até a gestão anterior), não era permitido o uso de livros didáticos. Os professores tinham que criar as aulas. Acredito que isso veio de um entendimento errado da teoria educacional construtivista. Achavam que elas (as crianças) constroem o conhecimento do nada. Além disso, já sabíamos que iríamos ter uma dificuldade para atender a Educação Infantil. A demanda é bem maior que a capacidade de atendimento do município. Isso não é segredo. Faltam cerca de 1.300 vagas.

DIÁRIO - Em relação aos livros, até os materiais didáticos do Ministério da Educação eram descartados?
CLEIDE - Mesmo os livros do PNLD (Programa Nacional do Livro Didático) não eram utilizados. Desde o ano passado voltamos a usar o currículo do MEC. É um material padrão. Na verdade, é preciso garantir um conhecimento inicial, o professor precisa ter instrumentos para assegurar uma frequencia de conteúdo do Ensino Fundamental que possibilite trabalhar enriquecendo isso com livros da biblioteca. O currículo escolar é um instrumento de desenvolvimento intelectual.

DIÁRIO - E o que a Prefeitura está fazendo para lidar o déficit de vagas na Educação Infantil?
CLEIDE - Atualmente temos 24 creches na cidade. Estamos otimizando os espaços que temos. Fizemos um estudo e constatamos as áreas com maiores necessidades. Dentre as creches em construção, temos uma para ser concluída na região do Jardim Santo André. Em setembro do ano passado sabíamos dessa necessidade (por mais creches) e fizemos uma parceria com o Estado para termos mais áreas disponíveis.

DIÁRIO - A secretaria estuda alguma mudança nos materiais didáticos utilizados na rede municipal?
CLEIDE - No ano passado, iniciamos o trabalho e, neste ano, estamos fazendo a confecção de um novo material escolar em parceria com a Fundação Santo André. Material que foi pensado para o município. A Fundação está preparando um portal interativo, para que o professor possa dizer o que está bom, e o que não está bom no material, para que, ao final, o professor se reconheça sujeito deste processo.

DIÁRIO - Já existe um prazo para a implantação deste projeto?
CLEIDE - O projeto para desencadear essas ações está esperando a aprovação do Prefeito. Ele assinando, já arrematamos essas ações. Já foi feita a primeira reunião com os professores para explicar esse processo. Acredito que até o final do ano já tenhamos os materiais.

DIÁRIO - Além da construção de um projeto curricular, qual foi o investimento feito no corpo docente neste primeiro ano de gestão da senhora?
CLEIDE - Foram feitos cursos de reciclagem e palestras para os professores em parceria com a USP (Universidade de São Paulo). Usamos formação continuada de maneira que a pessoa continue superando os seus limites.

DIÁRIO - A senhora acha que os professores estão contentes com a sua gestão a frente da secretaria? Você sente que eles estão querendo sair da rede municipal?
CLEIDE - Não creio que eles estejam descontentes. Os professores recebem os mesmo benefícios que recebiam os docentes do Estado.

DIÁRIO - Quais as intervenções que a cidade está fazendo nas seis escolas municipalizadas no início deste ano?
CLEIDE - A municipalização foi aprovada pelo Conselho Estadual de Educação no dia 20 de janeiro. Foram feitas reuniões nas escolas para esclarecer dúvidas dos profissionais, diretores, professores. Todos os professores titulares continuaram em seus cargos. Tivemos docentes de Educação Artística, três ou quatro, que não quiseram vir para o Município, pois estavam em estágio probatório e resolveram permanecer na rede estadual.

DIÁRIO - Na semana passada, foi aberto um concurso público para a contratação de professores em caráter temporário. Existe um déficit de professores em Santo André?
CLEIDE - A prática no município sempre foi de atribuir mais de uma sala para os professores titulares. Já existia um déficit.

DIÁRIO - E quando falta professor em sala de aula, é preciso juntar as classes?
CLEIDE - Eu acredito que isso não esteja acontecendo. Eu não estou negando a falta. Imaginávamos que iria sair um processo seletivo para professores em fevereiro, mas este processo não é uma iniciativa minha. Quem inicia isso não é a minha secretaria. A Educação é uma secretaria diferente. Temos uma população que precisa de professores, então nós continuamos com esta prática que atribuir uma segunda sala.

DIÁRIO - Porque foi aberto um concurso para professores temporários se ainda existem mais de 200 professores em uma lista de espera de um concurso realizado em 2006?
CLEIDE - Porque ainda não existem vagas para essas pessoas. Existe um projeto que será enviado para a Câmara para a abertura de um processo de criação de vagas. Só nó ano passado, chamamos 150 professores deste concurso. Aqui na cidade, quando um professor vira diretor de uma escola, ele não perde a sua classe. Esse último concurso é para a contratação de professores substitutos, para ocupar esses lugares que ficaram vagos.

DIÁRIO - A senhora falou que a pasta da Educação difere em relação as outras secretarias. Como sensibilizar as outras áreas de que a Educação é diferente? A senhora está encontrando dificuldades dentro da administração para trabalhar?
CLEIDE - Na verdade, não são dificuldades dentro da administração, mas dificuldades de compreensão da seleção. Você explica a situação (falta de professores), aguarda, vai ver o que está acontecendo e você percebe que não ficou muito claro, porque você é informado de que a administração quer fazer um processo seletivo unificado, com outras áreas. Mas, neste caso (dos professores), teria que ser um processo mais rápido, porque eu não posso ficar sem professor na sala de aula.

DIÁRIO - Em relação aos uniformes, já é possível garantir que eles ficarão prontos ainda no primeiro semestre?
CLEIDE - O empenho de todos é para que fique pronto neste prazo. Tentamos fazer tudo da melhor maneira. No ano passado, contratamos o Ipem (Instituto de Pesos e Medidas do Estado de São Paulo) para dizer para gente quais os materiais mais adequados para as roupas, as cores e os padrões. Tudo tão bem feito que entraram com um recurso para barrar a licitação, porque acharam que já estava direcionada (para alguma concorrente). É importante lembrar que há mais de 13 anos não tem uniformes nas escolas da cidade. É diferente você fazer uniforme quando você já um histórico de medidas atualizadas dos alunos.

DIÁRIO - O mesmo problema acontece com os materiais escolares?
CLEIDE - Todo o material de uso individual já foi entrega aos alunos. Só faltaram os apontadores de lápis, para os quais não apareceram interessados na licitação.

DIARIO - Qual o orçamento da secretaria para 2010?
CLEIDE - R$ 256 milhões. Estamos aplicando mais do que os 25% obrigatórios.

DIÁRIO - Para finalizar, qual nota que a senhora dá para a rede municipal de ensino?
CLEIDE - Por todo empenho da equipe da educação, nota 10. Tenho certeza de que temos uma rede de pessoas muito bem preparadas. No geral, dou nota sete, mas é preciso levar em consideração que, quando assumimos, estava abaixo de cinco.

Fonte: Diario do Grande ABC

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