Golpe usa nome do MEC para premiar escola
Um instituto da Grande São Paulo vende, por R$ 2.000, um prêmio educacional baseado em um ranking inexistente do Ministério da Educação
RICARDO GALLO
Um instituto da Grande São Paulo vende, por R$ 2.000, um prêmio educacional baseado em um ranking inexistente do Ministério da Educação. Anualmente, 150 escolas, supletivos e faculdades compram desse instituto o direito de ser premiadas como as "melhores instituições de ensino do Brasil", à revelia do ministério.
Entre as premiadas, estão ao menos seis instituições de ensino superior reprovadas pelo MEC, além de colégios sem expressão e/ou mal colocados no Enem – exame que avalia o ensino médio. Elas propagandeiam o prêmio como se fosse oficial e disseram não saber que não era do MEC.
Não há ranking nacional que junte escolas e universidades -elas são avaliadas por exames diferentes.
O ministério pedirá que a Polícia Federal investigue o caso e tomará as "providências judiciais cabíveis". Por meio da assessoria de imprensa, o ministro Fernando Haddad se disse perplexo. O MEC afirmou que fará campanha para divulgar em todo o Brasil índices oficiais, de modo a evitar o uso indevido de dados federais.
O Prêmio Nacional de Excelência em Qualidade no Ensino existe desde 2005, promovido pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa de Qualidade Gomes Pimentel, de Guarulhos.
Receberam o título de melhores do país escolas como o Qui-Mimo, de Guanambi (BA), o Jardim Escola Vovô Lima, de São Pedro da Aldeia (RJ), e o supletivo Supla, de Timbó (SC), além dos centros universitários Unieuro (DF) e Unibahia (BA).
A premiação foi em novembro, em um bufê no Tatuapé (zona leste de SP). Quem paga pelo prêmio tem direito a jantar, DVD, troféu e um certificado com brasão da República e o logotipo do governo federal ("Brasil, um país de todos").
Além de usar indevidamente o nome do ministro, o instituto colocou em seu site uma foto de Haddad como se ele estivesse presente em uma das edições do prêmio. Trata-se, na realidade, de imagem retirada do Google, de uma entrevista do ministro dada à TV UFMG.
Abordagem
É o Gomes Pimentel que procura as instituições para oferecer o prêmio, segundo relato de quatro "vencedores" à Folha. Primeiro, envia uma carta em que aponta o destinatário como potencial homenageado. São cinco critérios, quatro deles vagos: filosofia educacional, prática operacional, respeito ao aluno, responsabilidade social e qualidade de ensino.
Apenas o último item é medido pelo MEC, embora o instituto assegure se basear em dados oficiais.
Em seguida, vem a cobrança dos R$ 2.000, que podem ser parcelados em até oito vezes. O instituto chama o pagamento de "adesão" e diz aos 150 premiados que o dinheiro corresponde aos custos do evento. O informativo, a que a Folha teve acesso, é claro: só recebe o troféu e o certificado de qualidade quem estiver na "solenidade".
A negociação pode, em alguns casos, resultar em desconto. A Folha falou com uma instituição que disse ter pago R$ 1.700. Nos últimos dois anos, a relação de instituições "vencedoras" aumentou -em 2007, eram 120. A edição de 2010, marcada para 29 de novembro, já tem 18 instituições homenageadas, informa o site do instituto.
outro lado
Dono admite que usa dados que não são oficiais
Luís Renato Nogueira, proprietário do instituto Gomes Pimentel, afirmou em um primeiro momento à reportagem que o prêmio é baseado em dados do MEC. Depois, disse ter incluído instituições porque achou relevantes, caso do Supletivo Supla, de Timbó (SC), pelo trabalho com cegos e surdos. Por fim, admitiu que as 150 eleitas não são as melhores.
"São as 150 que eu acho que são." Leia trechos da entrevista. (RG)
FOLHA - Qual é o critério para dar o prêmio?
LUÍS RENATO NOGUEIRA - São os dados do Enem e todas as avaliações. Pegam-se as melhores instituições e o instituto faz a qualificação.
FOLHA - Mas o Enem só avalia escolas. Na lista também há instituições de ensino superior.
NOGUEIRA - Não é só a qualificação do Enem. Entra também qualidade do trabalho.
FOLHA - Como o sr. premia escolas mal avaliadas pelo MEC e diz que elas são as melhores?
NOGUEIRA - Não é somente pelo MEC. Os dados estão lá, abertos no site. Nós vamos e fazemos as avaliações. Vou dar um exemplo: o Supla Supletivo não tem nada a ver com o MEC. Como se qualificou? É a única instituição que trabalha com cegos, surdos, linguagens de sinais.
FOLHA - O sr. pôs no certificado o logotipo do governo federal.
NOGUEIRA - É bem diferente. Jamais colo minha imagem à do governo federal. Primeiro que eu não posso.
FOLHA - No evento, o mestre de cerimônias diz: "Uma realização Instituto Gomes Pimentel e Ministério da Educação".
NOGUEIRA - Realização, não. A realização é do instituto, com os dados do ministério.
FOLHA - Fica claro que é do MEC. Há até um falso representante do ministro.
NOGUEIRA - Foi um erro, entendeu?
FOLHA - Cinco escolas disseram que, para receber o prêmio, é preciso pagar R$ 2.000.
NOGUEIRA - Deve haver algum engano. Nunca cobramos. O que acontece: nós damos quatro convites. Se o convidado for com mais pessoas, aí paga, mas é coisa de R$ 50.
FOLHA - O próprio título do prêmio é incorreto. Não são as 150 melhores do Brasil.
NOGUEIRA - Claro que não são. São as 150 que eu acho que são. São as 150 melhores para o instituto.
Fonte: Folha Online
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